segunda-feira, 13 de abril de 2015

A primeira história que continuou.

A nossa história nunca foi das mais bonitas. O que era verdadeiro, não pôde durar. Te conheci como quem não quer nada. Não tinha absolutamente nada para fazer, e decidi sair sozinha para refrescar a mente. Observei um menino com seu violão e uma partitura quase que em branco. Ele era você. Provavelmente passara pela mesma coisa que eu: Falta de inspiração. Eu que deveria estar escrevendo naquele momento, estava refrescando minha mente para mais ideias chegarem. Eu não estava conseguindo me concentrar nas escritas. E você… Bom, também não deveria estar conseguindo. Sentei-me ao lado do menino do violão e decidi puxar assunto.
-Sem ideias?
-É… estou. - e sorriu como quem não sabe o que dizer.-
- Eu entendo. Também estou passando por isso. Você escreve músicas?
- É, eu meio que escrevo letras. Apenas para cantar com algumas notas no violão. É o que me distrai nas horas vagas.
- Eu escrevo também.
- Escreve letras?
- Não. Eu escrevo crônicas, poesias, histórias. E qualquer coisa que não faça sentido algum. Tudo que possa ser meloso e clichê. Sou uma das poucas pessoas que ainda acredita no amor.
-Sério? Olha… Acho que encontrei alguém que me entenda. Eu acredito no amor. São de amor as mais belas histórias existentes. São de amor as poesias mais brilhantes. E os sonhos mais indecentes. Não é mesmo?
- Eu nunca fui capaz de amar alguém. Mas pelo que dizem nos livros que leio, é sim. O amor é fantástico.
- Eu também nunca amei.. -E fez um olhar triste.- Mas, mudando de assunto. Você tem algum sonho?
- Tenho muitos. Sonho em escrever um livro. E em muitas outras coisas que ninguém acredita. E você?
- Eu… Eu sonho em fazer sentido. Em amar e ser correspondido. Sonho em poder escrever sobre minha própria história e não apenas sobre casais que só existem em minha memória.

Confesso que isso ficou na minha cabeça por dias. Pensei nesse menino brilhante, que diz coisas fantásticas e me parece ser um brilhante compositor. Acho que nunca encontrei alguém que me entendesse tanto em tão pouco tempo. Sair por falta de inspiração e voltar por acúmulo dela, foi algo um tanto quanto interessante. Mas minha cabeça funciona assim. Meu cérebro raciocina e compreende todas minhas funções. E minha mente faz barulho quando muitas palavras e pensamentos que não fazem sentido me perseguem. Afinal, eu não faço sentido algum. Escrevo sobre o que me dá na telha e não me importo com o que vão pensar. Escrevo para desabafar, e não para agradar. Mas, voltando ao assunto e a história. Eu e ele nos demos super bem. Nos compreendíamos nas palavras, nos sonhos e nas mesmas vontades: Encontrar um amor de verdade. Depois desse dia, nós dois resolvemos nos conhecer melhor. Nos encontrávamos sempre, e a cada encontro um momento especial acontecia. Demos nosso primeiro beijo embaixo da chuva. Nos víamos naquele mesmo banco de praça que encontrava-se em uma rua próxima de nossas casas. Ele sempre estava com seu violão e com sua partitura lotada de segredos.
Eu já estava apaixonada. Percebia pelo meu olhar que conspirava para ele, como pensamentos que são iguais. E nós dois pensávamos a mesma coisa: Será que ele/a sente o mesmo que eu?
A minha resposta era sim.
A resposta dele também.
E nós nunca precisávamos dizer nada. Nossos olhares apreensivos se compreendiam perfeitamente. E logo um beijo surgia. Namoramos por cerca de oito meses. Mas, ele era um cara sério, romântico e tinha a total certeza de que me amava. Me pediu em casamento no mesmo dia em que eu conheci o resto da família dele, os avós paternos que moravam em outra cidade. Eu aceitei o pedido. Tinha a total certeza de que o amava. Casamos um ano depois. Nossas famílias admiraram o ocorrido, tão inesperado. Foi romântico. A gente se combinava. Ele escrevendo suas músicas e tocando seu violão. Eu escrevendo minhas crônicas e tentando fazer sentido. O que eu mais gostava nele, era aquela forma sarcástica de me acordar cedo cantando uma música nova que ele passara a noite inteira escrevendo. Eu sempre o elogiava mais que qualquer pessoa.



Ele adorava me fazer surpresas, como comprar presentes e deixar um bilhetinho ao lado dizendo que eram para mim. Fazer um café da manhã fofo e levar até a cama. Me beijar enquanto eu resmungava por algo errado que ele havia feito. Ele sempre lia e relia coisas que eu escrevera. E eu admirava suas canções e seu jeito romântico de escrever sobre o amor que sentia por mim. Eu o amava. O amo. Como jamais amarei alguém. Fomos casados por quatro anos. E, bom, ao amanhecer o dia, como de costume ele havia saído cedo para comprar pães e ovos para o café da manhã. Percebi que ele estava demorando muito a voltar. E que uma multidão frequentara a rua naquele momento. Logo no portão, avistei um amontoado de gente em volta de um carro. Me assustei e corri olhar o que era. Ele provavelmente observava o que aconteceu junto com as pessoas.
- Lucas, Lucas, o que aconteceu aqui? - perguntei atordoada.
- Ele sofreu um acidente, senhorita Fernanda.
Uma das senhoras da vizinhança que assistia o ocorrido correu me avisar. Eu não queria acreditar naquilo. Mas logo avistei seu corpo no chão coberto por sangue. Passei mal, muito mal. Eu só torcia para que não tivesse sido nada muito grave. Tinha fé de que ele ficaria bem. Logo a ambulância chegou e levou-o até o hospital. Avisei a família dele que me encontrou por lá alguns minutos depois.


E passavam-se duas, três, quatro horas e nada de notícias. Estava preocupada, sentindo uma dor no coração. E finalmente, o médico apareceu e confrontou a todos da sala.
- Família do Lucas?
- Somos nós. Doutor, me diz como ele está?
- Bom, ele passou por uma série de exames. Teve ferimentos graves. Fraturas internas e externas. Machucados profundos. E não obteve uma melhora imediata. Nós tentamos… Tentamos de tudo… Mas não pudemos fazer nada. Me desculpe, mas o paciente Lucas não resistiu.

Meu mundo caiu naquele momento. Eu chorei como uma criança que se perde dos pais em um lugar cheio de estranhos. Foi assim que me senti. Aquilo não entrou na minha cabeça. Eu esperava que ele apareceria na minha frente sorrindo e dizendo que não havia sido nada grave demais. Enquanto todos se desesperavam, choravam, e gritavam, eu pedi ao doutor um único favor.
- Doutor, me deixe ao menos ver ele. Por favor.
-Sim, claro, me acompanhe.
Entrei na sala e observei seu corpo frio, apagado. Aquilo me doeu por dentro. Pesou minha consciência. Pensei em tudo o que poderia ter dito a ele antes, mas não disse. Não sabia se havia dado a ele o valor que ele merecia. Sussurrei em seu ouvido, o quão incrível eu o achava. O quanto eu o admirava. E que nunca no mundo existirá algum compositor tão maravilhoso quanto ele. Eu sabia que mesmo seu corpo não estando vivo, ele me escutava. Ele sempre me escuta, eu sei. É, eu nunca mais verei aquele rosto. Nunca mais escutaria aquelas músicas novas a cada manhã. E essa manhã, foi a última em que acordei com sua voz suave cantarolando, tentando me acordar. Foi a última madrugada que passei ao lado dele. E foi a última vez que observei seu olhar profundo. Que compreendeu o meu. E fez todas as coisas parecerem reais. Parecerem certas.
- Meu amor, vá em paz. Acho que esqueci de dizer hoje, que eu o amo demais. Não esquece de mim. Porque eu jamais esquecerei você. Fui muito feliz ao seu lado. Descanse.

Me despedi daquele rosto, dei lhe um último beijo. E lhe dei um adeus triste, e inconformado. Tão de repente, alguém que nós amamos partir assim foi algo assustador. Eu sentia que sua alma estava tentando me acalmar. Mas ele foi embora. E nada nem ninguém poderia o trazer de volta. Meu coração pesava em meu corpo. Eu estava destruída, com os olhos lacrimejando. Sem rumo. Sem conseguir acreditar. Realmente, temos de dar mais valor as pessoas porque amanhã elas podem não estar mais aqui. Podem ir embora e nos deixar com essa sensação de passado incompreendido. Sei que essa não foi a história mais bonita de contar. Mas tenho certeza de que ele foi embora com seu sonho realizado.

Ele amou e foi amado. Escreveu suas músicas sobre sua própria história e não apenas sobre casais que só existem em sua memória.

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