segunda-feira, 25 de maio de 2015

Garota Misteriosa 2

-Ei, espera.
-Me deixa. Eu não gosto de companhia. Eu não gosto de pessoas.
-Tudo bem. Do que você gosta? O que te faz bem?
-Bebidas. Cigarros. E a morte, que talvez seja o dia mais esperado da minha vida. 

E dá um sorriso cru. Ácido. Que o arrepia por completo. Essa garota era tudo, menos comum.
- Como você consegue dizer essas coisas?
- Com a boca. Se não quiser escutar o que não gosta, não pergunte o que quer.
E dá uma tragada em seu cigarro. Eram tantos cigarros em poucos minutos. O que seria de seu pulmão?
-Olha.. Você sempre tem uma resposta firme na ponta da língua. Gosto disso.
- Não é na ponta da língua. É na minha personalidade. Agora, me deixe ficar sozinha. Já perdi tempo demais com você.

E ela saí com seus passos firmes, seguros, longos e pesados. Acende mais um cigarro. E fuma com vontade. Ela era um corpo que vagava pelo mundo a procura de sua alma. Seu corpo havia cansado de sentir perdido. Deslocado. Vazio. Ela era incapaz de sentir. De guardar qualquer emoção, por menor que fosse. Ela não se comovia com nada. Quem era ela? Essa garota não era comum. Ela era um excesso. Que havia se acumulado demais. Um excesso que havia perdido a vontade de sorrir. Ela era um fim que parecia interminável. Uma palavra que era inexistente em qualquer dicionário. Era uma vontade que a cada vez mais se aumentava.


E ele não desistia. Ele queria mesmo conhecer aquela arte tão incógnita. Um verdadeiro enigma essa garota. Se escondeu. Mas não a perdeu de vista. E quando ela menos esperava, ele chega de mansinho. E sussurra em seu ouvido por trás.

-Sentiu minha falta?
- Ai, que susto! Ainda está aqui?
-Acha mesmo que eu iria embora? E deixaria você sozinha aqui? Jamais.
-Até parece que você se importa.
-Eu realmente me importo.
-Você nem me conhece.
-Porque você não permite. Estou tentando. Nem seu nome me falou ainda.
-Foda-se.
-Tudo bem. Garota misteriosa então?
-Garota cansada combina mais comigo.
-Cansada? Cansada de que? - E olha em seus olhos- Ei, me deixe te entender..
E ela respira fundo e diz:
- De tudo.
- O que te fez se cansar?
- Quer mesmo saber?
- Quero.
- Tudo bem. Estou cansada dessa vida medíocre que levo. Estou cansada do meu excesso de frieza. Estou cansada das decepções que me perturbam dia e noite. Tenho marcas até hoje. Estou cansada da falta de sentimento das pessoas. Foi por conta delas que me tornei isso aqui. Um vazio. Um vazio que nunca vai ser preenchido. Porque aprendeu a não deixar acumular. Aprendeu a não sentir nada mais. Satisfeito?

E ela abaixa a cabeça, como se estivesse arrependida de tudo que dissera. Acende mais um cigarro para disfarçar o nervosismo que corroía sua alma. Era tudo que ela conseguia sentir. Ódio. Desprezo. Angústia. Nervosismo. Dor.

- Nossa… Me desculpe! Você me deixa sem palavras com mera facilidade.
- É que você é um excesso de sentimentos a procura de palavras. Eu não. Eu sou um excesso de palavras que não está a procura de sentimentos. Jamais.
-É. Isso fez sentido, sabia? Talvez eu seja mesmo.
-Eu sempre faço sentido.
- Bom, agora que a minha garota misteriosa preferida resolveu abaixar as armaduras. E percebeu que eu não sou um monstro. Será que vai me deixar a ajudar finalmente? Eu gostei de você. Como a tempos não gostava de alguém. Vem comigo. Vamos sair daqui. Meu carro está logo ali na próxima rua..

E ela o interrompe, inconformada.
- Querido, eu não sou uma coitadinha perdida no mundo, não. Eu tenho meu carro. E mais umas malas de viagem dentro dele. Só dei uma pausa.
- Então você vai viajar? Está a caminho de viagem?
- É. Qual a surpresa nisso?
- Pensei que morasse aqui.. Para onde vai?
- Isso não te interessa.
- Interessa sim. Eu preciso te ver outra vez .
- Para de querer planejar o futuro. Esquece isso.
- Ei, eu não consigo ser tão despreocupado como você.
- Pois deveria. Se a gente tiver que se ver de novo, a gente vai. Pode acreditar. Vou nessa! Tenho que ir. Até qualquer dia.
- Ei, mas você acabou de beber. Espere. Eu preciso saber mais de você.

E a garota misteriosa que havia revelado um pouquinho de seu mistério já havia se perdido de vista. E ele, se perdido em meio a um turbilhão de pensamentos. Quem é ela? De onde veio? Para onde vai? Mora sozinha? Tem família? É casada? Tem filhos? Ele não sabia. Mas sabia que aquela garota louca havia mexido com ele de alguma forma.

Mas uma coisa ela deixou.. A esperança. 

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